Declaração de MSF por ocasião da VI Cúpula do BRICS, realizada em Fortaleza e Brasília, de 14 a 16 de julho.
15 de julho de 2014 –
Chefes de Estado de
Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul estão reunidos no Brasil
para a VI Cúpula do BRICS, onde devem concluir a criação de um banco de
desenvolvimento, estabelecer melhorias nos mecanismos de cooperação
financeira e enfatizar seus compromissos com políticas de inclusão
social. Médicos Sem Fronteiras (MSF) saúda a criação de iniciativas de
financiamento conjunto e pede aos chefes de Estado que assegurem que a
saúde seja uma área prioritária para apoio.
Como
uma
organização médico-humanitária, MSF enfrenta todos os dias o fato de
milhões de pacientes estarem excluídos do acesso aos serviços médicos,
em parte por causa das lacunas do atual sistema de inovação médica. MSF
está cada vez mais respondendo às necessidades médicas não atendidas de
pacientes vivendo em países classificados como de renda média ou alta;
em mais de 30 desses países, a organização executa programas que atendem
aos refugiados e migrantes, oferecem tratamento de HIV e tuberculose
(TB), emergência obstétrica e cirurgias de trauma e respondem às
emergências de curto prazo.
MSF
incentiva o aumento do financiamento do BRICS para a saúde com enfoque
nas necessidades prioritárias e pede que esses novos mecanismos garantam
que a inovação seja acessível e disponível a preços razoáveis aos que
precisam.
O
tema da VI Cúpula do BRICS, “Crescimento inclusivo: soluções
sustentáveis”, enfatiza o papel do BRICS em alcançar os objetivos
de desenvolvimento do milênio, assim como a reconhecida necessidade de
estruturas alternativas para coordenar os esforços conjuntos. Na área da
saúde, o BRICS enfrenta desafios comuns, como o problema da tuberculose
– já identificado como prioridade de saúde pública pelos ministros da
Saúde do BRICS – que necessita urgentemente de soluções sustentáveis.
O
BRICS representa 60% de todos os casos de TB entre os países com alta
carga da doença e 60% dos casos mundiais de tuberculose multirresistente
a medicamentos (MDR-TB). Apesar dos investimentos em iniciativas
nacionais e conscientização global, as ferramentas médicas existentes se
mostram insuficientes para lidar com a crescente crise de MDR-TB.
Como
um dos maiores fornecedores não governamentais de tratamento para TB
resistente a medicamentos, tratando 1.780 pacientes em 18 países no ano
de 2012, MSF está preocupada com o aumento dos índices de tuberculose
resistente a medicamentos (DR-TB) e com a falta de regimes de tratamento
efetivos. Os regimes de tratamento existentes - que são longos, tóxicos
e dolorosos – têm taxa de êxito inaceitavelmente baixa, com apenas 48%
dos pacientes sendo curados. Além disso, as tecnologias para diagnóstico
são
inadequadas para alguns locais com recursos limitados em que MSF atua e
os medicamentos não são adaptados para crianças.
Essas
deficiências estão enraizadas na forma como a inovação médica trabalha
atualmente. Doenças que afligem principalmente populações que não
representam um atrativo mercado comercial, como no caso da TB, sofrem de
crônica falta de investimentos e a ausência de prioridade nos esforços
de pesquisa e desenvolvimento (P&D) pelos investidores e inovadores
tradicionais
da biomedicina.
Diversos
desenvolvedores comerciais, por exemplo, anunciaram recentemente uma
redução ou completo abandono de P&D para medicamentos para TB. Além
disso, para os poucos novos produtos que foram desenvolvidos, a
acessibilidade continua sendo um problema crítico. Ainda além, os novos
medicamentos foram desenvolvidos sem uma visão de como eles deveriam ser
incorporados nas combinações dos múltiplos medicamentos necessários
para tratar a doença, atrasando significativamente os
benefícios para os pacientes.
Essas
falhas no sistema de inovação médica representam uma ameaça aos
compromissos do BRICS com a cobertura universal de saúde e vão exacerbar
inúmeros desafios de saúde pública enfrentados pelo BRICS, incluindo
doenças transmissíveis como HIV, TB e Hepatite C, além de doenças não
transmissíveis, como o câncer.
Os
ministros da Saúde do BRICS expressaram preocupação com a
acessibilidade a novas ferramentas médicas e demonstraram boa vontade em
cooperar na área de descoberta e desenvolvimento de medicamentos;
fundamentalmente, eles reconheceram que a cooperação em torno de novos
mecanismos para inovação deve priorizar a acessibilidade aos produtos
médicos.
Neste
sentido, as discussões em curso sobre a cooperação do BRICS em ciência,
tecnologia e inovação deveriam incluir apoio aos mecanismos de inovação
para preencher as lacunas em pesquisas de saúde e de medicamentos,
particularmente para aqueles que promovem P&D de forma colaborativa e
em função das necessidades e incluem provisões para garantir que o
financiamento sustentável vá para áreas de doenças caracterizadas por
falhas no mercado.
No
caso de TB, por exemplo, abordagens inovadoras para financiar e
coordenar P&D são urgentemente necessárias para acelerar o
desenvolvimento – a preços acessíveis – de novos regimes de tratamento
fundamentais para lidar com a epidemia. Ao trabalhar para atender às
necessidades de regimes mais efetivos de tratamento para TB não apenas
em projetos de MSF, a organização apresentou uma proposta – o Projeto 3P
– que tem como objetivo oferecer novos e mais efetivos regimes de
tratamento de TB que podem ser ampliados de forma responsável e a preços
acessíveis.
“As
deficiências no atual sistema de inovação médica são evidentes e o
BRICS está em uma posição única para desempenhar um papel ativo na
mudança da situação”, disse Felipe Carvalho, da Campanha de Acesso a
Medicamentos Essenciais. “Tendo lutado por décadas para garantir acesso
aos medicamentos e satisfazer suas necessidades de saúde pública, o
BRICS pode agora usar sua capacidade de pesquisa e produção para
fornecer soluções de longo prazo para superar esses desafios. Neste
momento, em que o BRICS está discutindo iniciativas de cooperação e
financiamento conjunto, é a hora certa para debater prioridades de saúde
por meio de modelos de inovação em função das necessidades e
que resultem em inovações médicas que estejam disponíveis a preços
acessíveis para todos que necessitem”, concluiu Felipe.
Atenciosamente,
Felipe de Carvalho
Campanha de Acesso / Access Campaign
Médicos Sem Fronteiras Brasil / Médecins Sans Frontières (MSF)
Rua do Catete - Catete
Rio de Janeiro, RJ - Brasil
Tel. + 55 21 3527-3602
Cel. + 55 21 8756-3005
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