quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Drama de soropositivo ilustra novo desafio no combate à Aids

Drama de soropositivo ilustra novo desafio no combate à Aids

Publicação: 27/07/2012 19:03 Atualização: 27/07/2012 17:50

Desempregado, José Luís da Silva não tem onde morar e passa as noites em banco de rodoviária (Júlia Carneiro/BBC Brasil)
Desempregado, José Luís da Silva não tem onde morar e passa as noites em banco de rodoviária
Eram 10h do dia 5 de setembro de 2007 quando José Luís da Silva descobriu que era soropositivo. No ano seguinte, soube que havia desenvolvido uma leucemia. Hoje, a vida está "a pior possível".

"Hoje sou um sem-teto", afirma Silva, de 47 anos, desempregado. Há quatro meses, ele passa as noites na Rodoviária Novo Rio, dormindo em um banco no segundo andar, usando a mochila como travesseiro. Quando consegue dinheiro de amigos solidários, dorme em uma pensão.

Silva toma os medicamentos antirretrovirais todos os dias, religiosamente, mesmo que não tenha o que comer. O coquetel vem ajudando a controlar o HIV, mas o tratamento médico não mata a sua fome. Sua única renda fixa são R$ 70 que recebe do Bolsa Família.

Silva é um exemplo de como o programa brasileiro para pessoas com HIV no Brasil, que inovou no passado ao determinar a oferta universal da terapia antirretroviral, hoje precisa de mais que remédio.

Ele não tem família e depende da solidariedade de amigos e da ajuda de ativistas de ONGs onde milita. A incerteza sobre o teto se arrasta desde que soube da doença. Morava com a namorada, mas ela pediu que saísse de casa um dia após saber do diagnóstico.

Assistência social
Mara Moreira, do Grupo Pela Vidda, diz que epidemia mudou de perfil e hoje está atingindo pessoas mais pobres (Júlia Carneiro/BBC Brasil )
Mara Moreira, do Grupo Pela Vidda, diz que epidemia mudou de perfil e hoje está atingindo pessoas mais pobres

Coordenadora de um programa educativo no Grupo Pela Vidda, Mara Moreira afirma que há um aumento de pessoas que chegam à ONG com demandas de cunho social.

Há muitos casos de pessoas que recebem alta do programa de Previdência Social, deixam de receber o benefício, mas não conseguem emprego, diz.

"A epidemia mudou de perfil e hoje está atingindo pessoas mais pobres. Temos recebido várias demandas na área de assistência social, com pessoas que precisam de recursos financeiros e de condições de sobrevivência mínima, mas não temos a quem recorrer", diz Mara, que tentou buscar apoio na Secretaria Municipal de Assistência Social, mas foi encaminhada de volta à Secretaria de Saúde.

Ela ressalta que a terapia antirretroviral exige que as pessoas se alimentem bem, e alguns medicamentos precisam ser mantidos na geladeira. "E aí as pessoas estão dormindo na rua. Como fazer?"

Para o psicólogo Veriano Terto Júnior, coordenador-geral da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), faltam medidas para além do fornecimento de antirretrovirais.

"O Brasil tem acesso universal (ao tratamento). Esse é o nosso grande resultado", diz. "Mas infelizmente começamos a ver um novo crescimento da taxa de mortalidade em alguns lugares, o que está menos relacionado à Aids em si do que a deficiências na assistência."

Mortes

No ano passado, 11 mil pessoas morreram por causa da Aids no Brasil. No Rio, o ritmo de óbitos vem aumentando desde 2007, diz Terto. "Isso é inaceitável para um país que tem acesso universal ao medicamento."

Apesar de ser bem articulado, Silva tem pouca esperança de conseguir um emprego. A última vez que tentou foi em uma empresa de ônibus do Rio que anunciara vagas para pessoas com necessidades especiais.

"O médico perguntou qual era a minha deficiência. Quando respondi, ele rasgou a minha ficha e disse que não contratavam soropositivos", lembra.

Ele diz querer um emprego, mas duvida que encontre um empregador que preencha seus requisitos. "Os patrões têm que entender que a cada três meses vou ter que me ausentar para ir ao médico, e que de vez em quando vou chegar atrasado."

Ele defende que pessoas em sua situação sejam beneficiadas por uma política de segurança nutricional, de moradia e de assistência pecuniária. "Eu não vou viver só de antirretroviral. Tenho que me alimentar."
Tags: celular

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